Palestra Cristiano Mascaro e Sergio Fingermann
12 de Setembro 06
Sergio Fingermann: “ O conjunto das fotografias de Cristiano Mascaro, nos faz ver o olhar do pensamento. Cada fotografia nos propõe uma intensificação de sua relação com os outros e com o mundo.
É uma busca ( no – do) imediato.
Contemplam-nos com um saber que se revela nessa proximidade. É um saber que não pode ser reduzido à significados, mas que nos faz atravessar, nos movermos, mais além da significação.
Se não atravessarmos a aparência das coisas permaneceremos prisioneiros da evidencia fácil, isto é, a realidade imediata.”
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Luz e Sombra
Algumas questões
Até agora acreditou-se ver mais as luzes do que as sombras.
O jogo das duas trabalha reminiscências.
O jogo das duas trama o tecido da memória.
O jogo das duas constrói os esquecimentos e alguns esclarecimentos.
Esse jogo produz uma realidade frágil e preciosa que chamamos imagem.
Esse jogo é ponte para um sonhar.
De onde vem o mistério?
A fotografia, assim como a pintura, nos conduz a ver um outro mundo.
Descortinam-se possibilidades para o estranho, os assombros, as impossibilidades, as insignificâncias.
Território de ilusões.
Lá, as coisas e pessoas estão imobilizadas em estado de atenção.
Lá, aquilo que se representa está destinado a um olhar.
Lá, as luzes duplicam, multiplicam as sombras, fazendo, numa espécie de mágica, as coisas parecerem mais densas e mais concretas do que elas mesmas.
Lá, pode-se brincar com as três dimensões em duas.
O fotógrafo, assim como o pintor, deseja ser um olhar e uma ação.
Que inteligência liga sua visão ao mundo?
Com quais artifícios, com qual teatralidade capta os sinais de uma vida?
Silêncio.
É preciso se evitar barulhos.
É preciso que se evitem também os barulhos das palavras, que muitas vezes vêm ocupar o lugar do olhar.
( Em relação à luz, as palavras são sombras)
É preciso se preservar uma certa autonomia da representação visual, fazendo-se assim preservar o lugar do visível, desviando-se das artimanhas e dos artifícios do discurso.
É preciso um saber olhar para captar e desfrutar das sensações semelhantes que surgem com e das imagens. É preciso ainda fazer, no engano que elas carregam, nos seus equívocos, a construção de nossos falsos e frágeis entendimentos.
Se as palavras são sombras, em que língua é possível dizer o que nos acontece?
As luzes e as sombras fazem ver o sensível na imagem.
Fazem ver o sensível da imagem.
Fazem ver as qualidades expressivas da coisa representada.
Toma os objetos sensíveis à visão.
Todo pintor, assim como todo fotógrafo, sabe que qualquer objeto possui sua própria dignidade e cabe ao artista restituí-la. Todo acontecimento é solene.
Às vezes, as luzes brincam, trocam a natureza das coisas. Às vezes trocam seus lugares. Mesclam, investem, mudam o lugar natural delas.
A luz interpreta mística ou esteticamente a percepção.
Às vezes, com a luz, temos a força de uma evidência.
A luz parece pensamento.
O claro-escuro dá às regras, as condições para o jogo das imagens.
Com este jogo, o fotógrafo, o pintor consegue imitar a aparência das cores. Todos nós já vimos que em certos dias, de muita claridade, pelas manhãs em geral, sob a luz, as formas, as sombras se retraem. Quando o sol está a pino elas são como que engolidas pelo chão. E à tarde, já se aproximando do fim do dia, as sombras crescem, dissolvendo-se na noite, seguindo os seus passos.
Os mais inquietos se questionam:
Será a noite a soma de todas as sombras?
Será que o tempo não tem perdas?
Será que uma mesma luz iluminava outros tempos?
Vejo ou me lembro?
Quando tomo consciência disso percebo que outras lembranças se interpõem no momento mesmo que estou vendo alguma coisa.
É comum ver o que se sabe.
Mas às vezes, outras memórias nos assombram...
Outras memórias vêm nos lembrar e se interpõem, dificultando ver o que surge, o que está diante de nós.
Ver pode ser uma experiência de encantamento.
Ver pode ser uma alegria intelectual.
Novamente o silêncio:
Olhar é uma experiência solitária.
Devemos enfrentar as seduções dos objetos sem auxílios.
Suportar as incertezas.
Suportar seu discurso só pode ser dito na sua própria língua ( da fotografia, da pintura).
O seu silêncio é feito de signos visuais.
Já disseram:
“A pintura é poesia muda”.
A fotografia também o é.
“O discurso sobre a pintura tenta dizer o discurso da pintura, manifestando um discurso na pintura”.
O que tece as representações?
O que nutre seus mistérios?
De que outras vidas a fotografia e a pintura supõe?
De que são feitos os silêncios das fotografias de Cristiano Mascaro?
Sergio Fingermann
O debate entre Cristiano Mascaro e Sergio Fingermann: - “ A interpretação das cidades” , foi realizado no Museu da Casa Brasileira. A forma, a composição, a luz e a sombra foram alguns dos temas abordados nesta reflexão.